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Leitaria Garrett
quinta-feira, junho 30, 2005
 

Entonces la ventana se abrió de par en par, como antiguamente, y Peter Pan entró por ella (…).

Era un niño todavía, mientras ella era una persona mayor. Se acurrucó al lado del fuego, y no se atrevía moverse. Sentíase culpable de ser ya una mujer.

- Hola Wendy – dijo él sin notar diferencia alguna, pues (…) en aquella débil claridad el blanco vestido de la dama podía muy bien haber sido el camisón de dormir con el cual la vio por primera vez.

-Hola, Meter Pan- dijo ella débilmente, empequeñeciéndose cuanto fue posible. (…)

- Peter Pan – dijo ella temblando- ¿esperas acaso que yo vuelva contigo?

- Naturalmente. Para eso he venido – Y añadió con cierta severidad- :

¿ Has olvidado que es la época de la limpieza de la primavera?

- No puedo ir- dijo excusándose – me he olvidado de volar.

- Pronto te enseñare otra vez.

(…)

Se habían levantado y un temor asaltaba ahora al niño.

-¿Qué es eso? – gritó estremeciéndose.

- Voy a encender la luz – repuso ella -, y entonces podrás verlo por ti mismo.

Casi por primera vez, que nosotros sepamos, Peter Pan se asustó.

- ¡No enciendas la luz! – clamó.

De todas las veces que representábamos el teatro ese de Barrie, me costaba hacerlo hasta el final. “Tonterías”, decía Bea; “Sentimentalismos artificiales”, le llamaba Alex. La verdad es que nunca lo he conseguido hacer totalmente. Me parecía todo demasiado real, y mi personaje demasiado vivo, demasiado yo mismo. El Rubio se aburría como sombra y salía haciendo el tonto por el piso, corriendo, jugando con sí mismo, subiéndose a las paredes de las habitaciones e desmembrándose en miles de otras sombras con las luces que llenaban el espacio. La Salamandra, en el suelo, no dejaba nunca su papel y gritaba “Peter, Peter, ¡cojéela! ¡Que se te escapa la sombra! ¡Vamos, animo, guapo!” Y se ponía enfadada con mi pereza (aún siendo Wendy y no Bea!). “¡Anda! ¡ ¡Qué ya sabes lo que dice Umbral! ¡Si no te apuras, estarás perdiendo parte de tu vida! Acuérdate: mientras te quedas inmóvil, ¡hay un reloj de pulsera fornicando en algún sitio con la eternidad!”. Y con esto, yo me despertaba de mi sueño real y salía corriendo detrás de la sombra. De mi sombra. Y terminaba riéndome, sin poder correr más, escuchando sus risas de lejos, eco por todo el piso…

 
  O que ainda me atrai em ti, humano, é essa tua incerteza no ser, essa dúvida que permaneces, essa subtil ambiguidade de seres ou não seres, ampliada na hipótese sempre vã de poderes ou não poderes vir a ser. O que me agrada é ainda a eminência da tua presença (ou falta dela!). E há depois o teu poliformismo amorfo que não chegarei nunca a conhecer na totalidade, na complexidade de ti como ser autónomo fora da complexidade de mim como ser autónomo.
Não quero esquecer a tua pluralidade como ser global, social, a tua competência de actor na minha plateia (que é também um palco).
Por onde entras? Por onde sais? Qual o teu papel e em que parágrafo da peça ou didascália confluem as nossas deixas?
Tudo isto que prefiro não saber, que opto por tentar não compreender. A tal incerteza já não no teu mas no meu ser. E atrai-me - Oh! Se me atrai! - esta possibilidade cíclica, que rapidamente se transforma em espiral e torna impossível juntar pontas.  
segunda-feira, junho 13, 2005
  Aqui, aí, na Alemanha de Leste ou de cá, em Amesterdão. Em qualquer um desses muitos cigarros que morreram com as nossas conversas e, que, como tal, permitem o segredo do muito que dizemos. Em ti. E em mim. Em nós.

Não te sei já agradecer o que tudo isto significa, porque já pulámos a barreira do significado das palavras. Se fores à tua sala de estar, junto da aparelhagem, há um city card que diz: "antes das palavras fecharem ideias, há um lugar indizível feito de relações". E é esse o lugar que ainda ocupas em mim. O do indizível. O da certeza de ti como a maior das relações. 
segunda-feira, junho 06, 2005
 

Cuatro: de ti solo he tenido un invierno.
Dos: las ciudades también sienten.


A fluidez do meu quotidiano já me tinha feito esquecer a dificuldade de uma despedida. Porque, ainda que nada disto tenha sido duradouro, há um abraço forte que dói durante algum tempo, há um beijo espalmado na palma da mão que fica preso algures no espaço que nos separa naquele momento, há um segundo em que fomos cúmplices e partilhámos o mesmo sorriso. Há uma lágrima egoísta que se esconde e se transforma em fumo de cigarro e em longa caminhada de regresso a casa.

A cidade de Inverno também sente: a confortável casa na vila de Duivendrecht, o pequeno apartamento do sétimo andar na Korte Geuzenstraat, aquele café, aquela ponte, aquele interminável Domingo de sol e calor humano, aquela reunião de amigos à força no nosso Plancius, aquelas noites de euforia caótica no claustrofóbico Winston, o som de hip-hop americano no Bitterzuit do canto, os palmiers turcos e os croissants ainda quentes da Harlemeerstraat, os passeios a dois na tua bicicleta, as história cúmplices num idioma só nosso, a tua biblioteca musical no I-pod branco, as sessões de filmes europeus “at the Movies”, os cigarros roubados ao tempo, os encontros a hora certa, as viagens planeadas e nunca realizadas, as discussões à entrada do parque, as refeições irmãmente partilhadas, os abraços de espera para nos aquecer do frio e nos aproximar do silêncio emocional, os sacos de pastilhas do Albert Heein, os smoothies que nunca o foram, o teu respirar de noite e o meu ressonar que não te deixou descansar mas te reconfortava, as manhãs de ressaca com longos cafés no Lauter da esquina, as pizzas turcas ao final da tarde, as corridas de bicicleta e de remo, os passeios contemplativos e silenciosos ao longo dos canais do Jordaan, os pores-do-sol com a silhueta da Westerkerk ao fundo, as caras cansadas no tram número três às 6h22 da manhã, as mensagens hardcore no Messenger do !Yahoo, os cigarros no topo do edifício da Greenpeace, as pizzas com sumo de laranja barato antes de terminar o turno da noite, o silêncio, as horas.

This is our story. This is the moment when we decided we would be witnesses of the first page of our travel-book. This is you crossing my path and me crossing yours. This is all I will never be able to describe in any of our different wor(l)ds. This is the world we decided to create and keep for ourselves and to the old coffeeshops at the Jordaan. This is me thanking you for making me see the sun when the clouds wouldn’t let me. And we will always have stuff like “keep your mouth shutted”, “catched”, and huge tons of language mistakes we’ll always remind and keep for ourselves, in silence, hidden behind a smile that we hope might cross the ocean.
 
quinta-feira, junho 02, 2005
 

El Rubio, le suelo llamar. Como Carlos de la canción, baila, tan delgado y siempre atento a su mirada. Lo mismo pasa con Alex: él color de un día triste no consigue apagar nada y por eso el Rubio baila y sigue bailando. No le gusta hablar mientras dibuja suaves movimientos en el aire del salón. Con los ojos cerrados, construye su propio universo en lo que nadie podrá nunca entrar. Nos gusta mirarlo así, a pocos centímetros de distancia. Giramos en espirales al su alrededor y surcamos el aire lleno de humo y partículas pesadas que no conocemos.

De lejos, Alex me parece inalcanzable.
 
 

(Mais) Promessas
Para que não se perca na usura dos dias, a lista de coisas que quero fazer quando regressar a casa:

Ler Sophia com a sofreguidão que só ela merece;

Pedir honestas desculpas à poesia, porque teimei durante tantos anos em não a considerar forma de inspiração ao quotidiano;

Escrever. Sentir-me e procurar ser-me na aventura das letras;

Perder o medo de viajar pelo mundo dos “outros” géneros musicais;

Dar atenção a todos os nomes e referências que levo comigo no final de mais uma viagem;

Deixar de me sentir inútil em frente a um monitor de tv;

Ver menos filmes. Fazer menos “filmes”.

Acreditar que sou capaz, que apenas me tenho que dar mais tempo a mim mesmo. E não sentir qualquer tipo de vergonha por isso. E não deixar que me pressionem quando o que quero é ser-me enquanto posso.

Estudar.

Estudar alemão (listas intermináveis de Unregelmaessige Verben e exercícios de gramática avançada)

Estudar Agustina.

Estudar Jorge de Senna.

Estudar Raul Brandão.

Voltar a sentir Vergílio Ferreira.

Revisitar Lídia Jorge e marcar novo encontro em páginas minhas conhecidas.

Ir ao encontro da fotografia e não esperar encontra-la unicamente fora da normalidade passiva e entediante do meu dia-a-dia.

Suicidar-me com vícios urbanos unicamente quando necessário.

Dormir menos durante o dia.

Procurar alargar os domínios do meu pobre vocabulário, destroçado após meses de raro esforço intelectual.

Fazer mais planos.

Estudar a carta topográfica de Granada e Sevilha. (na possibilidade de…)

Aprender a cozinhar com M. Pelo menos aprender a fazer sopa.

Gravar compilações piratas exclusivamente com melodias marisomonteanas. E fazer da incomparável voz um eco permanente dentro das cinco portas do meu WV Golf.

Acordar. Finalmente acordar!

Parar de renunciar à minha capacidade de ser global e deixar de procurar a alienação confortável em espaços fechados e secretos.

Explorar mais (ainda) a magnanimidade da rede. Sugar da Enciclopédia o mais possível, já que com contracto pré-pago ela não parece importar-se com isso.

Fazer das palavras de Rilke uma máxima. Como se isso fosse algo de novo… 
  "Sloth is of all the passions the most powerful passion and indeed no passion is more powerful than the passion of sloth" (Samuel Beckett)
 
  Me duele mi pereza, que se espeja en esta insubstancialidad diaria, en la busca inexistente de eso que sigo llamando de sueños. Me duele que estés tan cerca e te deje escapar. Sin querer te quiero. Y me duele. 
 

Já não sinto. Porque, ao sentir-me, saberia seguramente dizer-me. Estou bloqueado em mim mesmo, no interminável processo de crescimento em que me meti, na incerteza das coisas em mim mesmo, na ambiguidade do ser-me e do ser-me nos outros. Não me basta tão só isto.

Não me encontro na saída que me deram, recuso-me a assinar mais um papel que não sei para que serve. E por isso fujo, renuncio-me, escondo-me, abrigo-me em lugares onde me confunda a mim próprio, onde me sinta perdido, frágil. Procuro atenuar, desta forma, a dor da minha certeza existencial caótica. Apareço-me ao espelho de mim mesmo e vou-me mantendo entretido com a minha superficialidade, que cobre de forma alegre o martírio em que vivo. Pinto-me de cores alegres mas vivo do preto e branco. Vou-me gastando nesta agonia e neste pânico. 
 

MEMÓRIA, Apontamentos de, Amesterdão, Fevereiro de 2005

Águas que se reflectem na sala de jantar do prédio da frente ao final da tarde, quando o sol se deixa esconder por detrás das rasteiras habitações em bloco. Águas do mesmo canal que me saúda ao amanhecer e no final das horas. Águas que não necessitam permissão para atravessar a ponte móvel. Águas onde gaivotas dançam à chuva e à neve, perdidas por não haver mar por perto. Gaivotas como eu.

Turkish Pizzas a um euro e cinquenta: para quando não me apetece fazer de conta que sei cozinhar. “Zonde Sambel, please!, Only the white sauce!”

“Eu não sou da sua rua”, na voz de Marisa Monte, por um minuto e qualquer coisa; Ana Carolina como faixa número dois; entoações melodiosas de Gainsbourg à Gainsbarre; o ano de “1977” em FM.

Hábitos lusos num café de esquina. “At the Doggy, at one o´clock, as usual!” Inimaginável Wallpaper que suporta revistas gay, o El País de Domingo e magazines de interiores.

O sabor de palmiers explorado até à exaustão gustativa. Por 90 centímos, na padaria turca, mesmo no início da Harleemerstraat para quem vem do Plancius. Logo a seguir ao Banco nacional e à tabacaria onde comprei o postal demasiado grande para caber num envelope standard.

Tardes de Domingo que doem por estar tão longe. A procura de um refúgio conhecido no novo café do bairro, quando me embrulho no El País de três euros a pensar que é o Público e faço por saborear uma taça de café com leite como se fosse uma bica. Na tentativa desesperada de ter um Galeria ao atravessar o canal…

Aquele papel na porta da frente, para o qual sempre olho quando pergunto se está alguém: “Sue´s room”, escrito a caneta preta em papel autocolante de má qualidade. E o cheiro característico a terra molhada do incenso que lá dentro sempre dura.

Mais um número a fixar: 722. Quatro claustrofóbicas paredes brancas que procuro esconder com fotografias conhecidas e free city cards de variados temas e cores.

Os trams números 12, 13 ou 14 que me transportam para fora da minha vizinhança (tradução fraca). Van Baerlerstraat, Museumsplein, Van Gogh´s museum. De novo, tram número 2 até à Otto Heldringstraat ou números 5 e 17 para Leidseplein. Entretanto, Emmastraat, Valeriusplein e tantas outras que não fixei.

A “apple pie” a 3 euros, com “cream”, junto ao mercado matinal de Sábado. Cá fora, lá dentro, é igual. Desde que me não chova em cima…


O palco do Winston onde dançámos Beyonce e hits dos 80. A dj com rastas, réplica morena da Hillary Duff. As cervejas a 1,90! As claustrofóbicas escadas de acesso ao piso inferior: ter cuidado com a cabeça porque é muito fácil magoarmo-nos. O Dolce Vita do Fellini na tela, sem som, enquanto nos embriagávamos de som e fumo de tabaco. 
No Chiado, de tardinha, às vezes via-os passar sorridentes...de mão em mão...Dizia quem via:"São rapazes, bons portugueses!".Dona Ana passava também sempre à mesma hora,com os seus longos vestidos de tecido importado do Brasil...Carlos, o engraixador residente, com esse há-vontade que tem quem trabalha na rua,rodava o corpo enquanto Dona Ana passava e,do seu pequeno banco de madeira velha,gritava em suspiros, para que todos ouvissem,o mesmo de sempre:"Ai!, Madame!...Que até me causa indigestão!"

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